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Artigo - Posse, propriedade e cadastro ambiental: conflitos fundiários e insegurança jurídica no meio rural

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    TI Infographya
  • há 10 horas
  • 3 min de leitura

Por Marcos Vinícius Souza de Oliveira

 

Criado com a finalidade de integrar as informações ambientais das propriedades e posses rurais, compondo base de dados para controle, monitoramento, planejamento ambiental e econômico, bem como combate ao desmatamento [1], o Cadastro Ambiental Rural (CAR), enquanto instrumento de regularização ambiental, trouxe inegáveis avanços à gestão do uso da terra no Brasil.


Todavia, sua implementação desordenada, a ausência de controle efetivo dos dados pelo Estado e a falta de integração com os registros fundiários têm provocado um preocupante aumento de conflitos entre posse e propriedade, especialmente em regiões com alta concentração de imóveis rurais.


A utilização indevida do CAR como se fosse prova de posse ou propriedade gera efeitos jurídicos e econômicos severos para produtores rurais, fomentando insegurança fundiária, fragilização de direitos reais e intensa judicialização. Instituído pela Lei nº 12.651/2012 (Código Florestal) como registro obrigatório para todos os imóveis rurais, o CAR é, por essência, um instrumento administrativo e declaratório, desprovido de valor jurídico pleno para comprovação de propriedade ou posse.


O próprio legislador, no § 2º do artigo 29 do Código Florestal, foi categórico:


“O cadastramento não será considerado título para fins de reconhecimento de direito de propriedade ou posse.”


O Cadastro Ambiental Rural (CAR) não constitui prova de posse ou propriedade, sendo, por natureza, um instrumento de gestão ambiental. Sua utilização como título fundiário carece de respaldo jurídico e pode gerar interpretações equivocadas no âmbito das relações agrárias.

Ocorre que, na prática, o instrumento tem sido utilizado para tentar legitimar ocupações irregulares. Segundo o Painel de Regularização Ambiental, divulgado pelo Serviço Florestal Brasileiro em abril de 2025, há 138,9 milhões de hectares sobrepostos no CAR. Embora a soma das áreas declaradas ultrapasse 705 milhões de hectares, a estimativa real de território cadastrado é de 566 milhões. A diferença decorre de múltiplos cadastros sobre as mesmas áreas [2].


Essas sobreposições acarretam consequências jurídicas relevantes, como:


1) embargos administrativos por sobreposição com unidades de conservação ou terras indígenas;


2) indeferimento de crédito rural por suposta “irregularidade ambiental”;


3) litígios possessórios e ações de nulidade fundadas em cadastros conflitantes;


4) entraves para licenciamento ambiental e transferência de imóveis.


A fragilidade do CAR como prova territorial fomenta um cenário confuso: posseiros sem titulação formal conseguem cadastrar áreas ocupadas; arrendatários ou grileiros usam o CAR como argumento de regularidade; proprietários legítimos têm seus imóveis embargados ou questionados por cadastros de terceiros. Essa realidade contraria a lógica do sistema registral brasileiro, baseado na presunção de veracidade da matrícula e na nítida distinção entre posse e propriedade.

 

Nesse contexto, é imprescindível

-Alinhar o CAR à realidade dominial por meio de georreferenciamento e retificação de registros;

-Consolidar a prova da posse ou propriedade legítima com documentos, testemunhas, ITRs e contratos;

-Prevenir litígios ambientais e fundiários por meio de planejamento jurídico e regularização fundiária;

-Atuar judicialmente, quando necessário, para defender o produtor diante de sobreposições indevidas não solucionadas extrajudicialmente.


Necessidade de integração


A relevância do CAR para a continuidade das atividades rurais, aliada ao grave problema das sobreposições, evidencia a urgência de integração entre o cadastro ambiental, os registros públicos e os sistemas fundiários estaduais e federais. Tal medida evitaria a proliferação de conflitos, reduziria a sobrecarga do Poder Judiciário e, sobretudo, garantiria segurança jurídica ao campo.


Em síntese, por sua natureza, o CAR é um cadastro ambiental. Sua utilização como prova possessória ou dominial exige extremo cuidado jurídico. A sobreposição de cadastros, somada à informalidade na ocupação de terras, tem transformado o campo em palco de conflitos fundiários cada vez mais complexos. A harmonização entre política ambiental e segurança jurídica é condição indispensável para o desenvolvimento sustentável do agronegócio brasileiro.


[1] Art. 29, caput, da Lei 12.651/12




Fonte: Conjur

 
 
 

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